Desde o começo soube do perigo.
Sentia-se livre, confortável, como se já se conhecessem há muito tempo.
Uma vontade de ficar sem nem mesmo saber porquê.
"Perigoso, de fato muito perigoso", pensava.
Tentou, como pode, desvencilhar-se.
Experimentou outras bocas. Bebeu outras conversas. Cheirou outras peles. Deixou-se ficar em outros olhares e sorrisos.
Mas sempre voltava.
E quando lá estava, lutava contra a sensação de se deixar estar;
irritada, devora as manhãs ensolaradas, rasgava os lençóis da intimidade.
Desconfiava. Enxergava em tudo uma bruma negra. Sorvia essa realidade envenada.
Via traição onde a comunicação falhava. Ouvia o outro pensar o que ela mesma criara e fazia disso verdade inquestionável.
Gritava. Ofendia. Partia...
Até que, vencida, voltou. Dessa vez para saborear as manhãs, dormir nos lençóis, estar onde os momentos estavam.